A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) anunciou nesta sexta-feira, 18, a suspensão da manipulação, comercialização, propaganda e uso de implantes hormonais, conhecidos popularmente como “chips da beleza”.
A decisão, que deve ser publicada nas próximas horas no Diário Oficial da União (DOU), ocorre em resposta a um aumento significativo de denúncias de entidades médicas sobre problemas de saúde associados a esses produtos, conforme mostrou esta reportagem especial do Estadão.
Frequentemente produzido em farmácias de manipulação, o implante hormonal consiste em um bastonete de silicone do tamanho de um palito de fósforo que é inserido sob a pele — geralmente nos glúteos ou no abdômen — para liberar continuamente medicamentos e hormônios com ação anabolizante, como testosterona e gestrinona. Entre as promessas estão: emagrecimento, ganho de massa muscular, aumento da disposição física e da libido, além de alívio dos sintomas da menopausa.
Segundo especialistas, os dispositivos vêm sendo prescritos, mesmo sem estudos clínicos e regulamentação, de maneira indiscriminada por alguns médicos com motivações “altamente comerciais”.
Em comunicado, a Anvisa destacou que os “implantes hormonais, popularmente conhecidos como chips da beleza, não foram submetidos à avaliação da Agência e não existem produtos semelhantes devidamente registrados para fins estéticos, tratamento de fadiga ou cansaço e sintomas de menopausa”.
A decisão é fundamentada na resolução RDC 67 de 2007 e na Lei nº 6.360/1976, que exigem um acompanhamento rigoroso de todo o processo de manipulação por farmácias, garantindo a qualidade, segurança e eficácia dos produtos. As normas também preveem a suspensão de itens que possam causar danos à saúde. “A medida se aplica a todas as farmácias de manipulação”, enfatizou a Anvisa.
A orientação da agência é que pacientes que utilizam esses produtos busquem seus médicos para orientações sobre o tratamento, mesmo na ausência de sintomas evidentes. Aqueles que experienciaram ou estão enfrentando efeitos colaterais relacionados aos implantes devem fazer a notificação pelo sistema VigiMed.
Efeitos colaterais
Em setembro deste ano, o Estadão divulgou dados da primeira plataforma responsável por compilar dados relacionados ao uso indiscriminado de hormônios.
A iniciativa, chamada VIGICOM – Hormônios, foi encabeçada pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO) e pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Em apenas dois meses, mais de 200 casos de efeitos colaterais relacionados ao uso inadequado de hormônios foram reportados, quase 50% associados ao “chip da beleza”. As principais complicações apontadas foram problemas cardiovasculares como acidente vascular cerebral (AVC), hipertensão e arritmia. Além disso, foram registrados casos de dislipidemia (aumento de colesterol e triglicerídeos), internações em UTI, óbitos, crescimento excessivo de pelos em mulheres (hirsutismo), queda de cabelo (alopecia), acne, alteração na voz (disfonia), insônia e agitação.
Em agosto, as entidades por trás da plataforma e outras 27 sociedades médicas apresentaram uma proposta de regulamentação à Anvisa, na qual pediam a proibição total da fabricação, importação, manipulação, comercialização e propaganda de implantes hormonais manipulados.
Além disso, as entidades médicas apresentaram um levantamento de médicos que promovem ativamente o uso do “chip da beleza” em suas redes sociais, muitos dos quais se autodenominam especialistas em “hormonologia”, uma formação não reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Alguns desses profissionais oferecem cursos específicos sobre os implantes, prometendo “resultados clínicos e lucros” aos participantes.
O levantamento também incluiu farmácias de manipulação que produzem os dispositivos, que são vendidos posteriormente por preços que variam entre R$ 4 mil e R$ 10 mil. Algumas dessas farmácias disponibilizam formulários para que indivíduos se inscrevam como voluntários em treinamentos para a colocação dos “chips”.