Nesta segunda-feira, 18, o Brasil atingiu o maior número de casos de dengue da história. Com 1.899.206 casos notificados, o país superou o recorde anterior, estabelecido em 2015, quando 1.688.688 casos foram confirmados. Os dados são do Painel de Arboviroses do Ministério da Saúde, que tem monitorado a situação desde 2000.
O cenário já vinha se desenhando desde 2023, quando o país registrou 1.658.816 casos da doença. É importante ressaltar que os dados deste ano são preliminares e devem ser atualizados para cima, pois há um atraso nas notificações dos Estados e municípios. A última atualização ocorreu nesta segunda-feira, por volta de 15 horas.
Segundo especialistas, esse fenômeno é resultado de alguns fatores, como medidas pouco eficazes de controle do mosquito Aedes Aegypti, o vetor da doença. As ações clássicas incluem a conscientização sobre a eliminação dos criadouros, que, em sua maioria, estão dentro das residências, e o uso de repelentes e inseticidas.
Além disso, especialistas atribuem o ritmo atípico da epidemia ao fenômeno El Niño e às mudanças climáticas, que resultam em temperaturas elevadas e chuvas irregulares – condições ideais para a reprodução do mosquito e, consequentemente, a disseminação da doença.
Um estudo liderado por pesquisadores do Observatório de Clima e Saúde, do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict) da Fiocruz, e publicado na revista científica Scientific Reports, do grupo Nature, reforçou essa associação com o clima. O estudo observou que a ocorrência de anomalias térmicas positivas (ondas de calor) agravou as taxas de incidência, mesmo em locais que historicamente não enfrentavam surtos.
“No interior do Paraná, Goiás, Distrito Federal e Mato Grosso do Sul, o aumento de temperaturas está se tornando quase permanente. A gente tinha cinco dias de anomalia de calor, agora são 20, 30 dias de calor acima da média ao longo do verão. Isso dispara o processo de transmissão de dengue, tanto por causa do mosquito quanto pela circulação de pessoas”, afirmou Christovam Barcellos, autor principal do estudo, em comunicado.
Outro fator preocupante, segundo o Ministério da Saúde, é que os quatro sorotipos da dengue estão circulando simultaneamente – há anos isso não acontecia. Observa-se também uma interiorização da doença, com cidades pequenas e médias contribuindo para o aumento da curva de casos.
Principais sintomas
Segundo Julio Croda, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a dengue costuma envolver febre alta, acima de 39ºC, e pelo menos mais duas entre essas manifestações: dor de cabeça, dor atrás dos olhos, dores musculares, dores articulares e prostração.
Esse quadro indica a necessidade de procurar imediatamente um serviço de saúde. É importante evitar a automedicação, pois alguns analgésicos e antitérmicos, como aspirina e ácido acetilsalicílico (AAS), podem alterar a coagulação e agravar o quadro, favorecendo hemorragias.
“Todo paciente com suspeita de dengue deve ser acompanhado por uma equipe multidisciplinar”, disse Croda ao Estadão. Ele acrescenta que a equipe deve pedir o retorno do paciente a cada 24 ou 48 horas para avaliar eventuais sinais de alarme de que a hidratação oral se tornou insuficiente, sendo necessária a hidratação endovenosa.
Um aspecto especialmente cruel da dengue é que as complicações costumam ocorrer quando a situação parece estar sob controle. É após o declínio da febre, entre o terceiro e o sétimo dia da doença, que uma eventual piora costuma se manifestar, como resultado do extravasamento de plasma dos vasos sanguíneos ou de hemorragias.
Alguns dos sintomas da piora são dores abdominais intensas e contínuas, vômitos persistentes, letargia, inchaço do fígado e sangramentos.
Formas de prevenção
A eliminação de criadouros de mosquitos segue sendo uma das melhores maneiras de evitar a doença. Além disso, vale apostar em métodos físicos, como uso de roupas claras, mosquiteiros e repelentes, especialmente aqueles à base de icaridina, DEET e IR3535, que possuem duração superior em comparação a outros tipos.
A Qdenga, vacina contra a dengue fabricada pela farmacêutica japonesa Takeda, foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em março de 2023. Trata-se do primeiro imunizante de uso amplo contra a doença liberado no País. Anteriormente, a Anvisa havia aprovado a Dengvaxia, vacina da Sanofi Pasteur contra a dengue, mas que é indicada apenas a quem teve exposição anterior à doença.
Em julho de 2023, a Qdenga começou a ser oferecida pela rede privada no Brasil e, em dezembro do mesmo ano, foi incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS). Trata-se do primeiro País do mundo a disponibilizar o imunizante na rede pública de saúde. Devido ao número limitado de doses, contudo, inicialmente só crianças e adolescentes de 10 a 14 anos de 521 municípios selecionados pelo Ministério da Saúde serão vacinados pelo SUS.
Vale reforçar que ainda não existe um tratamento específico para a doença. Mas a hidratação adequada é capaz de salvar vidas.