Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e de outras cinco instituições descobriram que o vírus chikungunya é capaz de se espalhar pelo sangue, atingir múltiplos órgãos e causar danos cerebrais. Os achados foram publicados nesta semana na revista científica Cell Host & Microbe.
“Isso mostra uma necessidade de acompanhar o paciente, inclusive aquele que saiu da infecção aguda, que já melhorou. É preciso acompanhar porque essas manifestações podem aparecer um tempo depois da suposta cura”, diz o professor José Luiz Proença Módena, do Instituto de Biologia.
👉 Nesta reportagem você vai vai ver:
O estudo teve participação de virologistas, médicos, epidemiologistas, clínicos, físicos e estatísticos da Unicamp e das universidades do Kentucky (Estados Unidos), de São Paulo (USP), do Texas Medical Branch (Estados Unidos) e Imperial College London (Reino Unido), além do Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará (Lacen).
O principal achado foi a presença do vírus em amostras de líquor cefalorraquidiano, o que demonstra sua capacidade de atravessar uma camada protetora e alcançar o sistema nervoso, podendo chegar ao cérebro. Assim, ele causa danos neurológicos que podem resultar em sequelas ou levar o paciente à morte.
🦠 Porém, o vírus também pode causar as seguintes alterações no corpo do paciente infectado:
A pesquisa foi realizada no Ceará, que é um dos estados brasileiros mais afetados pelo vírus. “Por lá ocorrem várias ondas com um grande número de casos em um curto período de tempo […] as pessoas eram contaminadas, ficavam um período sem contrair o vírus novamente, mas ele aparecia em regiões próximas”.
No decorrer do trabalho, os pesquisadores perceberam outro fator importante: a mudança no padrão de sintomas:
🤒 Como normalmente ocorria: a chikungunya era relatada como uma doença febril e aguda, que causa dor e é sintomática em 70% das pessoas. Metade dos infectados apresentam inchaço articular e dor aguda, podendo evoluir para artrite crônica.
😫 O que o estudo percebeu: os pacientes estavam evoluindo para casos graves com uma taxa de frequência mais alta do que o esperado e eram acometidos por sintomas que, até então, eram incomuns (citados no trecho acima).
A confirmação da ação inédita do vírus foi confirmada com a análise de amostras de três grupos diferentes (pacientes que morreram com a doença, pacientes que sobreviveram e pessoas saudáveis, que não foram infectadas).
Primeiro, os pesquisadores analisaram o vírus para entender se ele poderia ser diferente, mas não era. Segundo José Luiz, algumas das amostras até indicavam a presença de uma mutação, mas ela aparecia tanto em pacientes graves, quanto nos leves. Logo, não poderia ser considerada responsável pelo agravamento.
Depois, passaram a investigar se alguma comorbidade estava levando os pacientes a esse quadro. No entanto, isso ainda não foi esclarecido. “O motivo a gente ainda não sabe. Ainda não se sabe se isso está associado a alguma característica genética da população ou uma doença, uma pré-disposição, uma doença de base”.
Por enquanto, a constatação é de que a gravidade está ligada a uma reação exagerada do sistema imunológico à infecção pelo vírus.
Mediante à incerteza sobre quem vai evoluir para a forma grave da doença, a descoberta destaca que é preciso reavaliar os protocolos de atendimento aplicados atualmente. “Aponta também uma necessidade de a gente olhar com mais atenção para os arbovírus, não só a chikungunya, como a dengue e a zika também”.
O professor diz que é importante os serviços de saúde acompanhem a situação dos pacientes mais de perto e estejam atentos à possibilidade de agravamento repentino do caso, mesmo naqueles que parecem ser leves. Além disso, também é necessário que os órgãos oficiais monitorem relatos de todo o país.
“Agora a gente quer entender esse cenário de agravo ocorre em outras regiões do país pra gente ter uma ideia se esse é um fenômeno que é convergente em outros lugares do Brasil. A chikungunya está circulando bastante atualmente, em Minas Gerais, em cidades do interior de São Paulo”, detalha o profissional.
O g1 pediu uma posição ao Ministério da Saúde sobre o assunto.
🦟 Segundo informações do Ministério da Saúde, o vírus chikungunya é uma arbovirose transmitida pela picada de fêmeas infectadas do gênero Aedes. No Brasil, até o momento, o vetor envolvido na transmissão é o Aedes aegypti, o mesmo da dengue e do zika.
O chikungunya (CHIKV) foi introduzido no continente americano em 2013. No segundo semestre de 2014, o Brasil confirmou, por métodos laboratoriais, a presença da doença nos estados do Amapá e Bahia. Atualmente, todos os Estados registram a transmissão.
As principais características clínicas da infecção por chikungunya são edema e dor articular incapacitante. Também podem ocorrer manifestações extra articulares. Os casos graves de chikungunya podem demandar internação hospitalar e evoluir para óbito.